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  • Paulo Jorge Pereira

"Vozes de Chernobyl", de Svetlana Alexievich

Jornalista que deu voz a sobreviventes de conflitos e desastres no espaço da antiga União Soviética e não só, a bielorrussa movimenta-se por entre emoções extremas com o à-vontade de quem não receia o choque.



Até ao momento em que conquistou o Nobel da Literatura, em 2015, a única obra de Svetlana Alexievich publicada em Portugal era "O Fim do Homem Soviético" (Porto Editora). Só depois chegaram "A Guerra não tem Rosto de Mulher" (editado originalmente em 1985), "As Últimas Testemunhas" (livro de 2016), "Rapazes de Zinco" (1992) e "Vozes de Chernobyl" (2006), todos publicados pela Elsinore. Quando a distinguiu, a Academia sueca argumentou que estava a premiar alguém com "uma escrita polifónica, monumento ao sofrimento e à coragem na nossa época" - os cinco livros de Alexievich constituem o projeto Vozes da Utopia, construído com base em milhares de depoimentos recolhidos em territórios diversificados. Para trás estava um longo percurso de trabalho e esforço para construir um estilo próprio. Filha de pai bielorrusso e mãe ucraniana, a futura jornalista nasceu na cidade ucraniana de Ivano-Frankovsk, então sob domínio soviético, a 31 de maio de 1948. Quando o pai deixou o Exército, a família voltou para a Bielorrússia, instalou-se numa pequena localidade e os pais tornaram-se professores. Alexievich deixaria a escola para ser repórter num jornal de Narovl, mas iria estudar Jornalismo na Universidade em Minsk. A sua coragem, o seu espírito arguto e inquieto levou-a a investigar e escrever sobre temas que vão desde o sofrimento de mulheres e crianças durante a II Guerra Mundial até à invasão soviética do Afeganistão ou ao acidente na central nuclear de Chernobyl. Pelo caminho despertou ódios e perseguições: em 2000, o regime ditatorial de Alexander Lukashenko não lhe deixou alternativa que não fosse procurar o exílio. Passou por Paris, Gotemburgo e Berlim antes de ser seguro regressar a Minsk, algo que só aconteceu em 2011.

Segundo o diário The Guardian, no seu blogue a jornalista admite que o estilo de escrita que adotou é muito influenciado pelo do bielorrusso Ales Adamovich, conhecido como uma espécie de "romance coletivo, coro épico ou pessoas a falarem de si próprias". O jornal cita uma entrevista de Alexievich em que a escritora pormenoriza: "Procurei um método literário que me permitisse o mais possível a aproximação à vida real. A realidade sempre me atraiu como um íman, torturou-me e hipnotizou-me, quis sempre capturá-la no papel. Por isso apropriei-me de imediato deste género com vozes e confissões humanas, testemunhos e documentos. É assim que vejo e ouço o mundo - como um coro de vozes individuais e uma coleção de pormenores do dia a dia. É assim que funcionam os meus olhos e os meus ouvidos. Desta forma, todo o meu potencial mental e emocional é preenchido na totalidade. Assim consigo ser, em simultâneo, escritora, repórter, socióloga, psicóloga e sacerdotisa", sintetizou.


Elsinore/Tradução de Galina Mitrakhovich


"Baseado nos depoimentos, recolhidos ao longo de dez anos, de mais de cinco centenas de testemunhas (polícias, bombeiros, pessoal da limpeza, políticos, médicos e cidadãos comuns), 'Vozes de Chernobyl' é um relato impiedoso do peso em vidas humanas e do sofrimento que se seguiu à explosão do reator número 4 da central nuclear, a 26 de abril de 1986", recorda o diário The Guardian.

O livro "Vozes de Chernobyl" deu origem a uma curta-metragem realizada pela irlandesa Juanita Wilson que recebeu uma nomeação para o Óscar em 2010 e foi premiada nos Irish Film & TV Awards.

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