Um trecho de "As Mulheres e a Guerra Colonial", obra escrita pela jornalista Sofia Branco, Presidente do Sindicato dos Jornalistas, é a proposta hoje apresentada por Fernanda Silva.
A guerra colonial dizimou milhares de vidas, destruiu famílias, casas e lugares, estropiou soldados e civis, deixou chagas psicológicas feitas stress pós-traumático que ainda hoje multiplicam vítimas sob a forma de violência doméstica e outras formas de violência. Ao longo de 13 anos, entre 1961 e 1974, milhares de soldados combateram, sofreram, viram horrores, mataram para não morrer, massacraram, cometeram atrocidades, foram presos, torturados, prenderam e torturaram. E as mulheres? O que lhes aconteceu ao longo desse tempo? Como sobreviveram e lidaram com uma série de diferentes papéis? Sofia Branco investiou e procurou respostas para estas e muitas outras perguntas, daqui nascendo "As Mulheres e a Guerra Colonial", de que hoje aqui é apresentado um excerto pela voz de Fernanda Silva. Há 49 histórias contadas que nos fazem revisitar aquele país que parece tão distante e estão sempre aconchegadas por poemas vindos das músicas de cantautores como José Afonso, José Mário Branco, Adriano Correia de Oliveira, Sérgio Godinho, entre outros. As histórias ilustram exemplos diferentes, falam de dias de dúvida, de dor e sofrimento, de constante incerteza e, tantas vezes, finais infelizes. Mas também de coragem exemplar e de situações desconhecidas para tantos que ainda hoje mal conseguem perceber uma ínfima parte do que se passou naqueles anos de ditadura, a longa noite fascista.
Outro exemplo da qualidade do trabalho de Sofia Branco foi lançado em 2006. O livro "Cicatrizes de Mulher" conta histórias de mulheres que foram submetidas a mutilação genital, tendo por base casos como os de Mariama, Tchambu e Cândida, testemunhos recolhidos em bairros com predominância das comunidades africanas em Portugal, na Guiné-Bissau e ainda em vários países europeus. Pela dimensão humanista e pela importância fundamental de abordar um fenómeno que continua a ser responsável por mortes e danos irreparáveis para muitas mulheres - ainda agora, no primeiro julgamento sobre a prática em Portugal, foi condenada a três anos de prisão e ao pagamento de 10 mil euros, uma mulher que permitiu a mutilação da própria filha com ano e meio -, a obra de investigação de Sofia Branco, então jornalista do Público e hoje na agência Lusa, recebeu seis prémios na área dos Direitos Humanos, como o Natali Europe, da Comissão Europeia e da Federação Internacional de Jornalistas, mas também a Medalha de Ouro da Assembleia da República. A obra foi apresentada na Feira do Livro, no início de junho de 2006 e, cerca de um mês mais tarde, quando teve apresentação na Guiné-Bissau, um dos 30 dos 54 países africanos onde a prática era corrente, a autora afirmou, citada pela comunicação social: "Tenho muito respeito pela tradição, mas o corte é desnecessário. Morrem mulheres por causa do parto que não se consegue concluir, morrem meninas com infecções. É necessária uma vasta campanha de sensibilização, a todos os níveis, para acabar com esta prática nefasta."
Além do trabalho empenhado no dia a dia como jornalista, Sofia Branco foi eleita Presidente do Sindicato dos Jornalistas em 2016 e reeleita em 2019, sempre com elencos diretivos paritários, desenvolvendo em conjunto com os companheiros da direção um trabalho profundo em defesa do Jornalismo e da profissão. Num contexto de enormes dificuldades, marcado por constantes despedimentos, precarização e ataques da mais variada índole aos jornalistas, Sofia Branco foi uma voz inquieta que nunca se escondeu, estando na primeira linha dos mais duros combates e reivindicando sempre mais e melhor para os profissionais do setor. Sob a sua liderança houve espírito de cooperação entre diferentes representações de jornalistas e, quase duas décadas depois da anterior edição, em 2017, durante quatro dias, realizou-se o 4.º Congresso da classe, onde foi possível debater diferentes temáticas e dar oportunidade a jovens estudantes de terem uma oportunidade de treinar a prática profissional numa experiência de redação laboratório que incluiu entrevistar o chefe de Estado. Mais recente, de dezembro de 2019, é a conferência sobre financiamento dos media, um tema bem dentro da atualidade e da delicada situação que as empresas enfrentam, na qual participou também o Presidente da República. Outro projeto que muito exigiu e está a dar frutos é o da literacia para os media, cada vez mais uma forma de aproximação a professores, alunos e à sociedade em geral, no sentido de que compreendam e interpretem melhor o papel do jornalista.
Mas, para lá da montanha de trabalho desenvolvido em Portugal nas mais variadas frentes, de cursos a palestras, passando por dar aulas de Ética, Sofia Branco destacou-se por ter igualmente presença e voz dinâmica no plano internacional. Não só abriu caminho à inédita eleição do presidente do Sindicato dos Jornalistas para o Comité Executivo da Federação Internacional de Jornalistas (FIJ), em junho de 2019, como foi também eleita para o Conselho de Género da entidade. Além disso, devido ao seu intenso trabalho, Lisboa acolheu, pela primeira vez, a assembleia anual da Federação Europeia de Jornalistas em junho de 2018, na qual foram aprovadas por unanimidade as moções sobre precariedade, violência contra jornalistas no desporto e desigualdades de género apresentadas pelo Sindicato dos Jornalistas.
Nascida na Póvoa de Varzim, estudante universitária em Coimbra, Sofia Branco é jornalista há mais de duas décadas, tendo realizado estudos em diferentes especialidades (islamismo, igualdade de género, mestrado em Direitos Humanos). Além das obras "As Mulheres na Guerra Colonial" e "Cicatrizes de Mulher" acima referidas, Sofia Branco coordenou, com Anabela Natário e Isabel Nery, a antologia "Tudo por Uma Boa História" (2017).
Esfera dos Livros
Jornalista indomável e infatigável Presidente do Sindicato dos Jornalistas, Sofia Branco tem variada obra escrita pela defesa dos Direitos Humanos, seja em livro ou em artigos.
Fernanda Silva tem participação regular aqui no blog. Tudo começou com "O Universo num Grão de Areia", de Mia Couto, a 28 de abril, seguindo-se "A Vida Sonhada das Boas Esposas", de Possidónio Cachapa (11 de maio), "Uma Mentira Mil Vezes Repetida", de Manuel Jorge Marmelo (8 de junho), "Bom Dia, Camaradas", de Ondjaki (27 de junho), "Quem me Dera Ser Onda", de Manuel Rui (5 de julho), e "O Sol e o Menino dos Pés Frios" (16 de julho), de Matilde Rosa Araújo. No passado dia 8 de outubro voltou com "O Tecido de Outono", de António Alçada Baptista e, a 27, leu "Histórias que me Contaste Tu", de Manuel António Pina, seguindo-se "Imagias", de Ana Luísa Amaral, a 12 de novembro, e "Os Memoráveis", de Lídia Jorge, apresentado no passado dia 16. A 23 de novembro, Fernanda Silva leu um trecho do livro "Do Grande e do Pequeno Amor", de Inês Pedrosa e Jorge Colombo. A 5 de dezembro apresentou "O Cavaleiro da Dinamarca", de Sophia de Mello Breyner Andresen e a 28 do mesmo mês fez a última leitura de 2020: "Na Passagem de um Ano", de José Carlos Ary dos Santos. A 10 de janeiro apresentou a sua primeira leitura de 2021 com "Cicatrizes de Mulher", de Sofia Branco, no dia 31 desse mês leu um trecho de "Mar me Quer", escrito por Mia Couto, e a 14 de fevereiro apresentou "Rodopio", de Mário Zambujal. A 28 de fevereiro foi a vez de ler um trecho do livro "A Instalação do Medo", de Rui Zink. No passado dia 8, foi possível "ouvê-la" no Especial dedicado ao Dia Internacional da Mulher, lendo um excerto da história "As Facas de Nima", escrito por Sofia Branco e parte do livro "52 Histórias". A 13 de março apresentou "Abraço", de José Luís Peixoto. No dia 24, foi a vez de ler "Cadernos de Lanzarote", de José Saramago. Ontem, a sua leitura de um excerto da obra "O Marinheiro", de Fernando Pessoa, integrou o Especial dedicado ao Dia Mundial do Teatro. A 28 de março leu um pouco do livro "Uma Viagem no Verde", de José Jorge Letria.
Comments